Situação Social Atual Global – 2016: Fome e Pobreza. Parte II
Situação Social Atual Global – 2016: Fome e Pobreza. Parte II
Como atuaram as MDGs e como atuarão as SDGs?
São várias as respostas. [Ref: Jeffrey D. Sachs “The Age of Sustainable Development”, Columbia University Press, New York, 2015]
Em primeiro lugar a simples existência de metas. Metas são fundamentais para a mobilização de esforços, para a superação de um modo de vida de continuidade tradicional – “business as usual” – para a procura de desenvolvimento. A formulação de metas ajuda a indivíduos organizações e governos ao redor do mundo a aderir a sobre um direcionamento das ações.
Em segundo lugar a publicação dos progressos induz uma pressão sobre os governos, mesmo que inicialmente não estivessem entusiasmados.
Em terceiro lugar metas mobilizam comunidades de conhecimento e comunidades que atuam para causas – ONGs. Um exemplo é a ação de grande sucesso de grupos pela causa do combate à malária. Provavelmente, também autores, que divulgam perspectivas e conhecimentos ajudam na formação de novas percepções. Novas atitudes dos cidadãos consumidores na preferência por alimentos orgânicos, em geral mais caros e na aceitação de preços mais altos por produtos certificados de “fair trade” – exemplo: vestuário produzido na Índia, estão no trajeto da configuração de uma Cultura na Situação Sustentável.
Esta mobilização, em quarto lugar, alcança redes de stakeholders entre as quais se incluem líderes de comunidades, políticos, ministros de governos, grupos religiosos, fundações e outras organizações doadoras, organizações internacionais que haverão de compactuar no empenho contra a pobreza, a fome e doenças.
Dos resultados até 2016 e das falhas.
Surpreendeu que os melhores resultados fossem alcançados na área da saúde. Três de oito metas do MDG eram orientadas para a saúde: Redução da mortalidade infantil, redução da mortalidade maternal e controle de doenças epidêmicas. Tais metas foram definidas em termos quantitativos de forma que os progressos podiam ser monitorados. O horizonte de prazo de realizações foi entendido como curto. O apelo humano era imediato. Comunidades de conhecimento, fundações privadas, empresas e agências internacionais cooperaram no desenvolvimento de novas tecnologias e procedimentos. E mobilizaram-se recursos para o combate de AIDS, tuberculose, malária.
Em outras áreas como saneamento e mesmo de agricultura e fome os resultados foram menos expressivos. Não se constituiu um fundo global para a provisão de água limpa e esgoto. A educação também não recebeu uma prioridade comparável com a saúde. Os prazos para o alcance de resultados foram percebidos mais longos. Mesmo os líderes políticos empenharam-se menos.
Conclui-se que o estabelecimento de metas não é suficiente para desencadear o desenvolvimento social. É preciso que se estabeleçam Políticas e Projetos para a execução de ações. Tais Políticas e Projetos de Desenvolvimento serão necessariamente públicos, pois só os Poderes Públicos têm autoridade e recursos para ações que alcançam grandes contingentes humanos e extensos territórios.
Uma falha fundamental – vício – dos MDG foi a índole patriarcal e filantrópica. Não estava previsto o esforço para a inclusão dos contingentes pobres na produção e na provisão de renda para a autossustentação de condições de conforto eticamente aceitáveis. Não se tinha uma visão de Situação Social Sustentável [vide acima].
Outras conclusões:
O resgate da miséria com fome e doenças de numerosos contingentes humanos só pode ser alcançado com o empenho dos Poderes Públicos, por melhores que sejam as orientações da iniciativa privada para os problemas na base de pirâmide social. Inclui-se nesta constatação a bem sucedida iniciativa do microcrédito e as práticas do “fair trade”.
O sucesso do Desenvolvimento Social na China é fundamentado num Projeto de Desenvolvimento Econômico com criação de oportunidades de trabalho e urbanização, dirigido com energia e a disciplina de um governo autoritário, aplicando métodos de economia de planejamento central. Na China a educação em todos os níveis tem uma atenção de alta prioridade.
Também nas sociedades com regime de governo democrático e economia de livre iniciativa a Responsabilidade pelo bem social cabe ao Primeiro Setor – Governo e Estado. Nas sociedades democráticas com economias desenvolvidas os problemas dos contingentes com as menores rendas são mitigados por legislações de redistribuição de renda, que são continuamente atualizadas. Estes modelos são adaptados nas sociedades democráticas em desenvolvimento e subdesenvolvidas, mas os recursos não são suficientes para atender às necessidades dos contingentes pobres com rendas muito baixas ou não integradas na produção.
Os países com contingentes pobres dependem do crescimento da produção para resgatar os cidadãos da base da pirâmide social da pobreza. Este objetivo é mais fácil de ser alcançado quando existir um grande mercado interno que absorva a produção industrial. O melhor exemplo desta condição é a maior economia do mundo, a dos Estados Unidos, com 350 milhões de habitantes, com pequena participação de exportações no PIB.
Uma política de crescimento econômico sustentável em sociedades com numerosos pobres significa uma política de criação de oportunidades de ocupação / trabalho com renda adequada para a superação da condição de pobreza. Entretanto, políticas de incentivo à iniciativa privada podem não ser suficientes, porque o alcance do emprego – produção – nas empresas é limitado por natureza. Os Estados podem então promover investimentos na configuração da estrutura econômica, que é precária nos países em desenvolvimento, mas que só têm retorno a prazos muito longos. A rigor não existem critérios para a delimitação entre investimentos privados e públicos. É habitual incluir entre os últimos a construção e a manutenção de vias de transporte, o fornecimento de água e saneamento, o tratamento de resíduos sólidos, projetos de despoluição, o provimento de habitações populares.
Atualmente reconfigurações das matrizes energéticas pela substituição de fontes de energia fósseis pelo aproveitamento de fontes renováveis – vento, sol e biocombustíveis – oferecem numerosas oportunidades de trabalho em todos os países desenvolvidos e menos desenvolvidos. Uma nova oportunidade para ocupação de mão de obra pouco instruída se apresenta na recuperação de áreas degradadas e na recuperação de bacias fluviais. Desta forma as necessidades urgentes do Desenvolvimento Ambiental Sustentável se combinam com as expectativas do Desenvolvimento Social Sustentável induzindo um crescimento das economias nacionais.
O que são condições de bem-estar mínimas eticamente aceitáveis?
As características adotadas para a Situação Sustentável (vide acima) implicam que as famílias obtenham uma Renda Adequada de trabalho com que financiem um bem estar eticamente aceitável. Trata-se de uma premissa para o exercício da Cidadania.
Todavia, nem as MDGs, nem as recentes SDGs, apontam para este objetivo explicitamente. Ações filantrópicas e paternalistas não libertam de dependências nem são conseguirão ser continuadas indefinidamente.
É evidente que sem a superação da pobreza extrema caracterizadas por fome, doenças, indigência, e ignorância um desenvolvimento social não é possível. E é impensável que sem um auxílio inicial a mobilização para ações próprias ocorra espontaneamente. A miséria é condição hereditária. Os acometidos em geral são conformados à situação, e talvez nem cultivem esperanças de super sua condição social. Auxílios em nutrição, tratamentos de saúde, estabelecimento de circunstâncias saudáveis e educação são essenciais para um primeiro impulso de desenvolvimento social e por isso justifica-se a prioridade nas MDGs.
Todavia as percepções de justiça social não são atendidas apenas com a superação dos níveis mais agudos de sofrimento. Por isso, com as experiências acumuladas nas ações das MDGs, a Organização das Nações Unidas formulou metas de desenvolvimento ampliadas – SDGs -, com maior ênfase em Desenvolvimento Econômico e Desenvolvimento Ambiental.
As Metas Globais. [SDGs]
Entre os tópicos da Agenda, estão questões como desigualdade, consumo, biodiversidade, industrialização, proteção social, oportunidades de trabalho, saúde e educação. De acordo com o documento, o fim da pobreza deve ser paralelo ao crescimento econômico, sem deixar de lado a atenção às mudanças climáticas e proteção ambiental. Entendeu-se que as metas estão entre si imbricadas. Ao assinar o acordo das SDGs, as lideranças mundiais se comprometeram com as 17 Metas para alcançar, nos próximos 15 anos, 3 objetivos: Erradicar a pobreza extrema; combater a desigualdade e a injustiça; e conter as mudanças climáticas.
1. Erradicação da Pobreza. 2. Erradicação da fome. 3. Saúde de qualidade. 4. Educação de qualidade. 5. Igualdade de gênero. 6. Água limpa e saneamento. 7. Energias renováveis. 8. Empregos dignos e crescimento econômico. 9. Inovação e infraestrutura. 10. Redução das desigualdades. 11. Cidades e comunidades sustentáveis. 12. Consumo responsável. 13. Combate às Mudanças Climáticas. 14. Vida debaixo d’água. 15. Vida sobre a terra. 16. Paz e justiça. 17. Parcerias planetárias.
As SDGs estarão sujeitas aos mesmos percalços das MDGs – vide acima – para serem realizadas. Evidentemente todas apontam para a direção da Situação Sustentável, mesmo que esta ainda não esteja definida. Esta lacuna conceitual atinge na dimensão social, especialmente, a questão da distribuição global da ocupação – do trabalho e da renda -, intimamente ligada ao conceito de Renda Adequada.
Considerando que a condição de sustentabilidade implica na capacidade e na liberdade dos cidadãos de decidirem sobre a organização de suas vidas, pode-se adiantar, tentativamente, que a Renda Adequada propicia uma condição de vida qualificável de “classe média baixa”. Nesta condição o cidadão assimilou a importância da educação própria e dos filhos. A Renda Adequada resulta da Ocupação Adequada. O empenho próprio generalizado é uma característica da Cultura na Situação Sustentável.
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